A ciência oceânica no Brasil e no mundo¹
O Mar Territorial, a Zona Contígua, a Zona Econômica Exclusiva e a Plataforma Continental brasileira abrangem cerca de 5,7 milhões de km², correspondendo a uma linha costeira com cerca de 8.000km, envolvendo 17 estados e 463 municípios e abrigando cerca de 25 % da população do país. As zonas costeira e oceânica brasileiras, denominadas Amazônia Azul, são um patrimônio que tem um papel fundamental no desenvolvimento nacional e na economia regional, sendo um fator importante para o desenvolvimento sustentável e o entendimento das mudanças climáticas globais. Para tanto, necessita ser conhecido para que seus recursos e serviços sejam utilizados de forma racional e sustentável. Isso requer uma abordagem integrada, sistêmica e baseada no melhor conhecimento disponível que subsidie a tomada de decisão. Nesse sentido, a ciência voltada para o oceano, enquanto um sistema socioecológico complexo, é um pilar da autodeterminação do Brasil enquanto nação, requerendo olhares sob diferentes pontos de vista, recortes teóricos e metodológicos variados, fontes de financiamento estratégicas e articulação institucional que se complementam no sentido de uma compreensão holística e estratégica da estrutura, função e governança desse ambiente.
No Global Ocean Science Report (GOSR), publicado em 2017 pela Comissão Oceanográfica Intergovernamental (IOC-UNESCO, 2017), são contabilizados mais de 370 mil artigos em ciência oceânica no mundo no período de 2010 a 2014. O Brasil participa em cerca de 13 mil deles. Para avaliar o crescimento da produção científica em ciência oceânica, os autores comparam os períodos de 2010-2011 com 2013-2014. Para o mundo, a produção do período mais recente foi 1,20 vezes o contabilizado nos dois anos iniciais. O Brasil teve, na mesma comparação, crescimento mais intenso, registrando aumento de 1,29 vezes. Em escala temporal mais ampla, o país estava na 15ᵃ posição no ranking de países em volume de produção científica em 2010, saltando para 11ᵃ em 2014.
A ciência oceânica brasileira tem evoluído e garantido presença importante na ciência nacional. No entanto, os desafios são amplos e ganham relevância na conjugação da ciência com os desafios humanos como os traduzidos pelos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030. Para superá-los, temos que garantir financiamento, encontrar novas estruturas e também novas formas de fazer e suportar uma ciência sob forte influência do processo global de digitalização.
Cooperação internacional do Brasil em Ciência Oceânica¹
A Década das Nações Unidas da Ciência Oceânica para o Desenvolvimento Sustentável apresenta uma estratégia para o desenvolvimento da ciência oceânica no mundo que vêm sendo internalizada e discutida nas escalas regional, nacional e subnacional em encontros promovidos em parceria com a Comissão Oceanográfica Intergovernamental (IOC-UNESCO, 2019, 2020a). No Brasil esse processo vem sendo coordenado pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) com uma série de encontros ao longo do país e que gerarão as bases do Plano Nacional de Implementação para a Década.
A cooperação internacional tem sido um grande dinamizador da pesquisa oceânica brasileira, ainda que o Brasil não venha assumindo, recentemente, um grande protagonismo nesses projetos. Como o Brasil é usualmente convidado a participar dessas iniciativas, essa atuação contribui para a internacionalização da pesquisa e dos pesquisadores, ainda que de forma mais reativa que proativa.
Apesar desse cenário, o Brasil é o país na América Latina e Caribe com maior centralidade e maior número de conexões na rede de países com maiores registros de publicações, apresentando um pequeno mas perceptível avanço na colaboração internacional entre os períodos de 2000–2005, 2006–2011 e 2012–2017 (IOC-UNESCO, 2017, 2020b).
A cooperação internacional vem sendo fortalecida por uma série de estratégias que podem ser enquadradas enquanto ações de diplomacia científica. Os esforços de diplomacia científica têm desenvolvido diversos caminhos para ampliar a colaboração internacional do Brasil, desde a negociação e assinatura de acordos internacionais ao desenho conjunto de estratégias de fomento à pesquisa e participação em projetos e programas internacionais (IOC-UNESCO, 2020b). Além disso, as intensas atividades de pesquisa do Brasil no Atlântico Sul colocaram o país em posição de liderança científica na região, ampliando as possibilidades de colaboração internacional (MCTI, 2016).
Um destes esforços, a Declaração de Belém consolidou e amplificou as relações no Atlântico em pesquisa oceânica, tendo sido assinada em julho de 2017 pela Comunidade Européia, África do Sul e Brasil. Esse mecanismo de cooperação visa fortalecer a cooperação em pesquisa e inovação no Oceano Atlântico e dialoga com a Declaração de Galway sobre Cooperação no Oceano Atlântico, assinada em 2013. O MCTI tem apoiado o projeto AANChOR – Cooperação Atlântica para a pesquisa e inovação oceânica (All Atlantic Cooperation for Ocean Research and innovation), uma das peças centrais de materialização da Declaração de Belém.
A ciência oceânica é intrinsecamente global, seja em função dos fluxos e intercâmbios naturais de um oceano que é uno, “um planeta um oceano”, seja por lidar com áreas que são internacionais por definição legal. A questão que deixamos é como o Brasil, com sua imensa costa e relevante capacidade de pesquisa e desenvolvimento, pode trabalhar para ter uma inserção internacional mais consistente, com liderança acadêmica e institucional e um maior protagonismo na ciência oceânica global.
Créditos
1 – Esta página foi composta a partir de trechos dos artigos “A Ciência Oceânica no Brasil e desafios transversais para a produção do conhecimento” de Roberto de Pinho, Alexander Turra e Jailson Bittencourt de Andrade; e “Cooperação internacional do Brasil em Ciência Oceânica” de Alexander Turra, Roberto de Pinho e Jailson Bittencourt de Andrade. Ambos encontram-se em processo de publicação em edição especial na revista Ciência e Cultura, da SBPC.
IOC-UNESCO. 2017. Global Ocean Science Report — The Current Status of Ocean Science around the World. L. Valdés et al. (eds), Paris, UNESCO Publishing.
IOC-UNESCO. 2019. A ciência que precisamos para o oceano que queremos: a Década das Nações Unidas da Ciência Oceânica para o Desenvolvimento Sustentável (2021-2030). Paris.
IOC-UNESCO. 2020a. United Nations Decade of Ocean Science for Sustainable Development 2021 – 2030, Implementation Plan Version 2.0, 2020.
IOC-UNESCO. 2020b. Global Ocean Science Report 2020–Charting Capacity for Ocean Sustainability. K. Isensee (ed.), Paris, UNESCO Publishing